Hype 50+

No mercado prateado, as melhores oportunidades surgem para quem sabe conectar os pontos. Foi assim que nasceu a ISGAME, uma escola de games inovadora que fortalece a saúde mental.

Era parte da rotina de Fabio Ota esse caminho. Quando pequeno, ele adorava voltar do colégio e passar na casa de seu avô para conversar e ouvir histórias. Quando se dava conta, as horas tinham voado. Desde cedo, Fabio tem o hábito de ouvir pessoas mais velhas. Essa afinidade o fez criar, em 2002, o primeiro curso de inclusão digital para idosos em São Paulo. E, anos depois, a primeira escola de desenvolvimento de games para o público 50+. O caminho que o levou de um ponto ao outro, definitivamente, não é uma linha reta. Mas é uma jornada interessante que merece ser contada.

Parece impensável nos dias de hoje. Mas há 16 anos, as aulas de informática, oferecidas pela Câmara Júnior Brasil Japão, aos 60+ eram focadas em operações simples como ligar o computador, acessar um site, fazer uma busca no Google, mexer no mouse e digitar. Um modelo que fez – e ainda faz – muito sucesso, contabilizando mais de 10 mil alunos. Aquele pode ter sido o início da relação de Fabio com a educação digital. Naquela época, o empreendedor também liderava uma empresa de desenvolvimento de games cujo desafio era a falta de profissionais qualificados. Para resolver esse problema, ele fazia visitas às universidades, oferecia treinamento para os alunos e os contratava como estagiários.

A vida seguiu, a empresa foi vendida, Fabio começou a trabalhar com desenvolvimento de sistemas até que, 14 anos depois, seu filho, já com 15 anos, chega em casa com um pedido:

– Pai, quero aprender a desenvolver games.

Existiam apenas duas grandes escolas em São Paulo que ofereciam um curso assim. Os dois foram visitá-las, conhecer a metodologia, os professores, mas algo incomodava Fabio. Dois anos parecia muito tempo para começar a criar o próprio jogo. Na época em que treinava os estagiários, gastava apenas alguns meses. Será que não existia um outro modelo?

Saindo de uma das visitas, propôs ao filho Ricardo:

– Vou montar um curso de games.

Dez alunos formaram uma turma piloto – todos amigos de Ricardo – com computadores trazidos de casa dividindo espaço na sala de estar da família Ota. Algumas aulas de teste para validar o modelo e pronto. Aquele método fazia sentido: aprender a programar um game antes da modelagem. E, no processo, desenvolver habilidades de raciocínio lógico, criatividade, planejamento e concentração, que seriam úteis para a vida inteira.

O MVP deveria começar sem grandes investimentos. Antes de pensar na construção de uma laboratório moderno de informática, Fabio decidiu bater na porta de escolas em São Paulo apresentando o curso. Uma delas, em Alphaville, aceitou o projeto e passou a oferecê-lo como atividade extracurricular.

Nascia ali, oficialmente, a ISGAME: International School of Game.

O modelo inspirado no desenvolvimento de competências cognitivas realmente funcionava. E não só para as crianças. Se fosse aplicado também aos idosos, Fabio imaginava, talvez ajudasse a atenuar o declínio cognitivo natural da idade, além de prevenir problemas de memória e o avanço do Alzheimer, por exemplo.

A proximidade com o tema vinha de casa. Ele já tinha casos da doença na família e sabia da incidência hereditária. “Eu pensava que muito do que nós ensinávamos às crianças poderia ser utilizado como prevenção de doenças mentais para os mais velhos. Comecei a estudar mais sobre isso.”, ele conta.

Ao mergulhar no assunto, Fabio descobriu os resultados recentes de uma pesquisa feita pela Universidade da Califórnia que comprova: os jogos ajudam na prevenção do declínio cognitivo e de doenças como o Alzheimer.

“No Brasil, 7,6% da população acima de 60 anos sofre com a doença, sendo que esse número pode chegar a 8% em 2020, o que representa um aumento de 55.000 casos por ano.”

 

Iniciativas como a de Fabio, que buscam prevenir essa incidência, são pioneiras não só pela forma de abordagem do problema, mas também pela visão ampliada do mercado. Tratam-se de pessoas acima de 50 anos com necessidades pessoais que não podem ser resolvidas em uma consulta médica.

Nessa mesma época, sua esposa estava fazendo um tratamento de fisioterapia conhecido como neurofeedback. Nele, são aplicados eletrodos na cabeça do paciente que se conectam a uma tela, exibindo em tempo real as atividades cerebrais. Parecia um video game! Conversando com a fisioterapeuta de sua esposa, Carla Oda, ele trouxe a ideia que há muito já vinha pensando: cursos de desenvolvimento de games que melhorassem a saúde mental dos idosos.

Fabio e Carla, ao lado de mais dois especialistas em Psicologia e Gerontologia e uma Pedagoga, montaram uma equipe para levar esse projeto adiante. Inscreveram a ideia na FAPESP, pelo Programa Inovativo para Pequenas Empresas, e foram aprovados! Em 2016, eles tinham 200 mil reais para rodar uma pesquisa que comprovasse a relação entre os games e a melhoria cognitiva dos maduros.

O projeto envolveu 75 idosos que vivenciaram a metodologia desenvolvida por Fabio. Durante o experimento, foram realizados dois cursos: um de criação de games e outro que ensinava os alunos a jogar. Um nativo digital talvez nem consiga imaginar como se desenrola um curso assim, mas para muitos idosos que desenvolviam o jogo, mover as setas, fazer o personagem pular ou usar os botões do joystick não eram operações comuns.

Um ano depois, os resultados apareceram: melhora na concentração, raciocínio lógico, memória e qualidade de vida.

O que Fabio conta é que não existe uma diferença fundamental no curso dado às crianças e aos 50+. O que muda é o ritmo e a velocidade das aulas. O jeito de explicar, o cuidado individual e a empatia de se colocar no lugar do aluno mudam de geração para geração. Hoje, as aulas da ISGAME  já são oferecidas na Unibes Cultural, para as mais diferentes faixas etárias. A ISGAME já tem parceria com 2 Colégios particulares na Zona Sul de São Paulo, oferecendo o curso aos alunos e também aos pais e avós interessados.

O grande diferencial do curso para 50+, que já conta com 120 alunos formados, é também a formação de novos instrutores. O aluno sai do curso apto a desenvolver o próprio game e ensinar os outros, multiplicando a metodologia de Fabio Ota na mesma velocidade de expansão da escola.

Esse crescimento acelerado e a visão multidisciplinar do negócio foram grandes destaques da 1ª Chamada dos Negócios da Longevidade, organizada pelo Aging2.0 São Paulo, Ativen e Hype60+, em São Paulo.

Depois de mapear 141 startups do ecossistema de longevidade, a iniciativa premiou a ISGAME como um dos modelos mais inovadores desse mercado. Fabio Ota agora conta com o apoio de mentores especialistas para ajudá-lo nos desafios de expansão da escola. Além disso, ganhou também uma estação de trabalho no coworking Civi-co, em São Paulo, para fazer reuniões e treinamentos sem custos com a infraestrutura.

Criar um negócio viável, interessante e sustentável no mercado prateado já é um desafio por si só. Ampliar o seu impacto por meio de conexões com outros campos da medicina, neurologia e gerontologia é subir um novo patamar. A conexão com outros campos do conhecimento abre um novo caminho para o surgimento de startups inovadoras, lucrativas e de alto impacto social. A história da ISGAME é, talvez, o melhor exemplo disso.

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